Novas tecnologias da genética microbiana são o futuro da produtividade

Com um crescimento anual médio de 11% e um mercado global estimado em 3 bilhões de dólares, os produtos bioestimulantes têm se tornado uma das soluções para aumentar a produção agrícola de forma sustentável. Para que esses produtos sejam desenvolvidos, é essencial entender as diferentes relações direta e indiretas que os microrganismos estabelecem com as plantas através da genética microbiana, possibilitando o surgimento de novas tecnologias. 

Para falar sobre o assunto, a Verde convidou Doutora em Genética e Melhoramento de Plantas e Professora do Departamento de Genética da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP), Dra. Maria Carolina Quecine Verdi, para o “Genética microbiana: novas tecnologias e o futuro da produtividade agrícola”.  

O papel dos microrganismos nas interações com as plantas 

Os microrganismos são seres microscópicos que estão presentes nos mais diversos ecossistemas. Num sistema de cultivo agrícola, eles vão estar presentes principalmente no solo, na superfície das plantas e colonizando os diferentes tecidos vegetais internos. 

Estima-se que 1 grama de solo possua mais de 10 mil espécies diferentes de microrganismos e 50 bilhões de microrganismos, estando entre eles vírus, bactérias, protozoários e fungos. 

Nessa extensa diversidade e quantidade existem dois principais grupos de microrganismos denominados: benéficos e patogênicos. Os denominados benéficos, incluem aqueles capazes de gerar benefícios diretos e indiretos para o solo e plantas com os quais interage.  

Já os patogênicos são aqueles capazes de causar doenças e consequentemente levar a prejuízos econômicos para o agricultor. Segundo a Dra. Maria Carolina, um mesmo microrganismo pode ser tanto benéfico quanto patogênico e o que define o seu papel no ecossistema geralmente é determinado por fatores bióticos e abióticos: 

“Associados às plantas nós temos microrganismos tanto patogênicos quanto benéficos, mas devido a relevância econômica do primeiro é o que acaba sendo o mais bem estudado. Muitas vezes são as condições ambientais e nutricionais da planta que fazem com que esse microrganismo que já está interagindo com a planta se comporte como patogênico, causando doenças.” 

Como entender sobre esses microrganismos e o tipo de interação que eles estabelecem com as plantas? 

A genética microbiana é uma ferramenta para entender mais sobre os microrganismos. Uma das formas de entender mais sobre essa interação e comportamento entre os microrganismos e as plantas é através da genética microbiana. Essa área da microbiologia e engenharia genética realiza estudos genéticos e moleculares de regulação e detalhes de mecanismos de transcrição, translação e replicação de sistemas microbianos. 

Alguns modelos dos eventos moleculares que regulam a interação entre microrganismos e plantas para alguns patógenos modelos e microrganismos benéficos já são bem entendidos.  

Porém, a professora Maria Carolina explicou que ainda faltam muitos estudos para entender como os microrganismos se comportam na planta de acordo com as condições ambientais e os mecanismos que eles utilizam para promover o crescimento das plantas as quais estão associados. 

Grande parte desses estudos partem do compreendimento do genoma desses seres. O genoma consiste em toda a informação hereditária de um organismo que fica em seu DNA, uma molécula responsável por armazenar a informação genética da grande maioria dos seres vivos. 

Através dele, se torna possível não apenas identificar a espécie dos microrganismos, mas como também orientar grande parte das pesquisas e eficiência do uso dos produtos biológicos, como explicou a Dra. Maria Carolina: 

“Quando temos o genoma completo, nós buscamos entender a interação desse microrganismo com a planta. Isso é vital para otimizar o processo de inoculação, aumentar a eficiência dos produtos.” 

Como essas pesquisas se dão na prática e quais resultados esperados ao levar essa tecnologia ao campo? 

O desenvolvimento de novos produtos bioestimulantes  

O processo para o desenvolvimento de um novo produto bioestimulante começa com a fase de coleta, na qual uma planta é selecionada e diversas amostras em diferentes ambientes são coletados. 

A Dra. Maria Carolina inclusive ressaltou que os ecossistemas nativos tem um grande valor nesse aspecto de preservação da biodiversidade desses microrganismos e se tornam um patrimônio de grande potencial econômico para o país. 

A partir daí, procede-se para a etapa de bioprospecção dos microrganismos, caracterização dos compostos relacionados a promoção de crescimento vegetal e ensaios em casas de vegetação. Uma vez verificado o potencial do microrganismo para promover o crescimento das plantas, são realizados ensaios a campo. 

Um exemplo é a pesquisa conduzida pela professora Maria Carolina com a espécie de bactéria Bacillus thuringiensis RZ2MS9, isolado da rizosfera do guaraná, com bons resultados: “Em nossas pesquisas, verificamos resultados bem promissores do Bacillus thuringiensis RZ2MS9. Quando nós fizemos a bioprospecção in vitro dos compostos relacionados a promoção do crescimento, verificamos a sua capacidade em disponibilizar fósforo, fixar nitrogênio e produzir AIA, um fito-hormômio relacionado com a promoção do crescimento vegetal. Também in vitro foi observado o seu potencial para o controle de pragas, como insetos.” 

Nos estudos sobre Bacillus thuringiensis RZ2MS9 foi verificado o quanto as plantas inoculadas com o microrganismo nutricionalmente aparentavam estar melhores, além da promoção do crescimento vegetal.  

Foi descoberto também que, no caso dessa espécie, a produção de fito-hormônios, como as auxinas, teve um papel essencial na eficiência dessa bactéria promotora de crescimento em colonizar as raízes, assim como na melhora do desempenho agronômico da planta: 

“As auxinas são importantes para os microrganismos como fator de promoção de crescimento, porque muitas vezes a produção desse composto por bactérias promotoras de crescimento associadas a rizosfera está relacionada a aumentar a massa radicular da planta. Ao proporcionar esse aumento, os microrganismos tem mais pontos de interação com a planta e ela com um maior sistema radicular consegue se manter mais bem nutrida.” 

Para que essa e todas as demais pesquisas do setor sejam conduzidas, a Dr. Maria Carolina ressaltou a importância das agências de fomento para o investimento nas pesquisas de ponta. Assim, elas podem realmente trazer soluções para sociedade, visando sempre a sustentabilidade. 

Os microrganismos são uma das alternativas para o aumento sustentável da produtividade agrícola 

A continuidade dos estudos sobre microrganismos tem demonstrado cada vez mais resultados promissores dos benefícios do uso desses seres microscópicos na agricultura. Com isso, a professora Maria Carolina destacou que cada vez mais empresas estão abrindo seu portifólio para oferecer ao agricultor não só produtos químicos, mas como também biológicos, que vão ajudar na sanidade ou promover o crescimento das plantas. 

Ela concluiu que cada vez mais vamos ver relações de sinergismo entre o uso de produtos químicos e biológicos, buscando produzir mais com menos recursos naturais e gerando menos impactos ambientais: “Eu não acredito que o uso de químicos substitua o uso de biológicos, eles podem estabelecer uma relação de sinergismo e andar juntos.

Matéria: https://www.agrolink.com.br/noticias/novas-tecnologias-da-genetica-microbiana-sao-o-futuro-da-produtividade_452190.html